domingo, 23 de janeiro de 2011

Processo de imitação

Uma criança de dez anos avisou os coleguinhas de que iria pegar a arma do pai, policial, atirar na professora e depois se matar.
Não é a mesma ação que várias vezes é noticiada na mídia: entrou na escola, atirou em x alunos e depois se matou.
O primeiro processo de aprendizagem é a imitação. E todos nós o fazemos, mesmo que muitas vezes não o percebamos. (DRP : 27/09/2011) 
E a minha maior preocupação é que vocês, assim como eu, não terão esse processo de aprendizagem como um auxiliador no aprender médico.
Por que digo isto?
Por causa das condutas erradas que se repetem e que vocês acabarão repetindo ao se espelharem nos colegas mais experientes que vocês admirarão.
Toda prática está infectada por vícios (condutas erradas) por melhor que venha a ser o profissional. E acredito que isto aconteça em todas as atividades humanas, não só na medicina.
Quando a gente aprende  epidemiologia, a gente entende a importância da conduta tanto para evitar quanto para provocar um erro.
Vocês devem ter sabido de uma filha que foi ao encontro da mãe morta e, quando olhou a gaveta da “geladeira”, a mãe ainda respirava.
Começou a gritar como louca, avisando que a mãe ainda estava viva.
E agora os familiares se revezam ao lado do leito da mãe.
Nesse caso, parece que um médico “diagnosticou” a morte e que um outro, sem examinar a paciente, assinou o atestado.
Quando um diagnóstico importante deste – a morte de alguém – é diagnosticado, uma boa conduta da equipe médica é de que no mímino mais um colega examine a paciente para verificar o diagnóstico. No caso de morte eu aconselharia até que mais dois colegas do plantão confirmassem o óbito.
E se eu fosse o chefe de equipe, eu pessoalmente seria um desses três, porque no final das contas a maior responsabilidade é do chefe da equipe.
Mas no Brasil parece ser uma agressão muito grande você verificar o diagnóstico de outro colega.
Então, mesmo você sendo chefe de equipe e adotando tal proceder na sua equipe, o que provavelmente acontecerá é que o outro colega, chegando ao lado do corpo, simplesmente olhará e querendo dá cartaz ao outro, ou não querendo magoar o outro colega, simplesmente confirmará o diagnóstico sem examinar.
Esse proceder acontece em todas as áreas, é cultural.
Aí, quando acontece o erro, fica todo mundo se perguntando por que aconteceu.
E pior, se você adotar essa conduta e realmente examinar o paciente na tentativa de evitar que tais erros aconteçam, em vez de ter o agradecimento dos seus colegas, provavelmente será rotulado como: chato, cricri, metido a sabe tudo,…
Outra coisa muito chata é você adotar essa conduta e ao chamar o colega para dar uma segunda opinião em um caso difícil, ele chegar com aquele ar pedante, dando a entender ao paciente que é o tal e que você não sabe nada.
Aí, por causa desse tipo de colega, você nunca mais pedirá para ninguém verificar um diagnóstico difícil, abrindo as portas para que um erro médico aconteça.
O que eu sempre vi, foi os médicos operarem, preencherem as papeletas e depois irem dormir, quando de plantão ou sairem do hospital após suas cirurgias eletivas para dar sequência as suas atividades.
Por processo de imitação também fiz o mesmo.
Mas posteriormente raciocinando – quando não mais exercia a profissão – percebi que esta conduta estava errada.
É necessário que, após a cirurgia, você fique verificando os sinais vitais, pois caso verifique qualquer alteração, você pode corrigi-la rapidamente com menor risco para o paciente.
Assim também no parto, faz-se o parto normal e pronto. Nunca mais vê a paciente exceto se houver uma complicação.
Mas a conduta correta é que depois do parto, você vá examiná-la para verificar se o pós-parto está correndo bem. Se você fizer isso, você verificará rapidamente se uma paciente estiver com um sangramento maior do que o normal e o corrigirá.
Sendo chefe de equipe, a minha conduta seria, além de instruir os médicos do meu plantão a fazerem isto nos seus atendimentos, eu também verificar o pós-parto e o pós cirúrgico. Essa é uma conduta preventiva que evita muitos problemas.
O que acontece, quando não se faz essa conduta preventiva é que quando o médico é chamado o caso já está grave e muitas vezes trabalha-se a noite toda tentando corrigir um caso. Isto se conseguir e não evoluir para óbito.
Mas o mais triste disto tudo que estou dizendo é que se você adotar tal conduta preventiva, provavelmente será olhado estranhamente pela equipe de enfermagem que não está acostumada com a conduta correta e talvez até ridicularizado pelos outros colegas médicos.
É com muito pesar que digo isto a vocês, mas no Brasil, muitas vezes o certo é tratado como errado.